Fonte da maior concentração de fauna das Américas e maior planície alagada do mundo, o Pantanal foi inspiração para a obra escrita há mais de 30 anos por Benedito Ruy Barbosa e que chega à TV Globo no dia 28 de março de 2022, no horário das nove, em uma nova versão escrita pelo autor Bruno Luperi, com direção artística de Rogério Gomes. A obra é uma saga familiar que tem o amor como fio condutor e a natureza como protagonista.
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Do mergulho entre tantas lições, evidentes ou metafóricas, junto à profundidade dos personagens que navegam pelo mar de detalhes que constroem a novela, surge o elo que sela o sucesso histórico da trama. “O Pantanal resgata heróis. É uma característica muito forte da obra do meu avô, que tem um caráter épico e fala sobre valores com personagens fortes e inspiradores. O José Leôncio é um personagem que te inspira, que te faz acreditar que o mundo pode ser melhor, que existem pessoas que são corretas, dignas. Ainda assim, ele comete seus erros. A novela também tem esse caráter humano, que é o que mais me move, porque gera empatia. Ninguém é perfeito. A possibilidade de se apaixonar e odiar o protagonista e o antagonista é real”, comenta o autor Bruno Luperi.
Como toda adaptação, a história original passa por mudanças e atualizações necessárias para conversarem com uma nova realidade e uma nova geração. As atualizações, claro, não se limitam ao texto, mas também às imagens fascinantes do Pantanal que serão atualizadas. “Hoje em dia, temos a tecnologia a nosso favor. Na época, Jayme Monjardim conduziu muito bem a novela, foi ousado, fez um desenho de produção diferente, mesmo com todas as dificuldades. Hoje, as câmeras são menores, temos drones, câmeras para dentro d’água, a qualidade de captação é outra, é tudo muito mais moderno. Você consegue captar imagens do Pantanal de maneira diferente daquela época, quando eles não tinham esses recursos”, diz o diretor artístico Rogério Gomes.
A história
No tronco central dessa jornada, repleta de dramas familiares e conflitos, está a história do velho Joventino (Irandhir Santos) e seu filho, José Leôncio (Renato Góes / Marcos Palmeira). A lida como peão de comitiva os levou para o Pantanal, onde Joventino aprendeu a lição mais importante de sua vida: que a natureza pode mais do que o homem. Ao confiar o seu destino nas mãos da natureza, o peão compreende que nada se conquista através da força, ou no laço, como ele acreditava. Nascia, assim, a lenda do maior peão de toda aquela região. O velho Joventino ficou afamado por trazer os bois selvagens, os ditos marruás, no feitiço. Porém, foi logo após essa compreensão que Joventino desapareceu sem deixar rastros, deixando o filho, José Leôncio, sozinho à espera de seu pai.
José Leôncio segue no comando da fazenda e, em uma viagem ao Rio de Janeiro, conhece Madeleine (Bruna Linzmeyer / Karine Teles), com quem se casa. Os dois se mudam para o Pantanal onde nasce Jove (Jesuíta Barbosa). A passagem de Madeleine pela fazenda, porém, é um caos. Com saudade da vida urbana e da mordomia da mansão de seus pais no Rio de Janeiro, a jovem não se acomoda àquela sina de solidão que é ser mulher de peão. Com o marido sempre em comitivas, ela se vê obrigada a conviver com Filó (Leticia Salles / Dira Paes), funcionária da casa a quem pouco conhece e nada confia. A verdade é que Madeleine não entende bem a relação de Filó com José Leôncio, tão pouco a relação dele com Tadeu (Lucas de Oliveira Santos/ Gustavo Corasini/ José Loreto), filho de Filó e afilhado do patrão. O que Madeleine não sabe é que José Leôncio e Filó tiveram um envolvimento, no passado, durante as viagens do peão.
Madeleine foge do Pantanal levando Jove, ainda bebê, de volta para a mansão da família Novaes. O menino cresce longe do pai, que se viu incapaz de brigar pela guarda do filho. José jamais deixou de cumprir suas obrigações legais, enviando fielmente uma quantia excepcional de pensão mensal, sem se dar conta que onde sobra dinheiro, falta o afeto. Jove cresce acreditando que seu pai havia morrido, enquanto o pai, sem saber da mentira criada pela ex-mulher, não procurava o filho, acreditando ter feito o melhor ao se afastar de vez de Madeleine.
Na ausência de Jove, o fazendeiro encontra em Tadeu um herdeiro, mais do que para as suas terras, para os valores e tradições de sua família. Com a partida de Madeleine, Filó revela a José Leôncio que Tadeu é seu filho. Apesar da alegria dos três – em especial de Tadeu -, a informação é guardada por eles à sete chaves. De forma que, da porta para fora, Tadeu segue apenas como afilhado do patrão, o que lhe dói profundamente.
Duas décadas se passam marcando a mudança de fase na novela. Jove descobre que seu pai está vivo e vai à sua procura. É desse encontro e de sua enorme expectativa, embalados por uma festança para todo o povo da região da fazenda, que começam os grandes conflitos entre os Leôncio. Embora desejem profundamente viver a relação entre pai e filho, José Leôncio e Jove são confrontados por um abismo de diferenças comportamentais e culturais, inaceitáveis aos olhos um do outro. Não bastasse isso, o rapaz ainda precisa lidar com o ciúme de Tadeu, que carrega no peito o vazio de não se sentir um “legítimo Leôncio”. Amado, mas não reconhecido. Para completar a confusão familiar, em determinado momento todos são surpreendidos com a chegada de um terceiro filho para disputar o amor e a admiração deste pai: José Lucas de Nada (Irandhir Santos) chega à fazenda por obra do destino e descobre ali os laços familiares que nunca teve.
O cenário pantaneiro abriga ainda o encontro entre Jove e Juma Marruá (Alanis Guillen). Filha de Maria Marruá (Juliana Paes) e Gil (Enrique Diaz), a jovem não abre a guarda para ninguém. Apesar da pouca idade, Juma é uma mulher forte, que aprendeu com a mãe a se defender do “bicho homem”, a espécie mais perigosa que pode vir a rondar a tapera onde mora. Também pudera. Foi o bicho homem que levou seu pai, sua mãe e cada um de seus irmãos. Forjada pela desconfiança, Juma se torna uma mulher selvagem e arredia. “Não existe quem consiga domar aquela onça“, dizem. Porém, as mesmas razões que afastam Jove de José Leôncio, o aproximam de Juma. Entre eles, uma linda paixão se inicia. Um amor puro, fruto desse encontro improvável e natural, que marca para sempre o destino de todos. Contudo, não demora para que as diferenças culturais e sociais do casal tornem a relação em muitos níveis complicada e bastante improvável. Para a alegria de uns e lamento de outros.
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Em cada detalhe deste conto, há um fator comum: a necessidade de aceitar a natureza como ela é. E o grande porta-voz deste ensinamento é o Velho do Rio (Osmar Prado). Um encantado – uma entidade sobrenatural –, que na maior parte do tempo assume a forma de uma sucuri (a maior de todo o Pantanal), mas que também se apresenta na forma humana. O Velho do Rio é responsável por cuidar não só daquelas terras e dos animais que ali habitam, mas por zelar pelas relações interpessoais que se desenrolam por lá. Para ele, o homem é o único ser que “queima as árvores que lhe dão o ar e envenena a água que bebe”. Essa e outras lições vão moldando os caminhos dos personagens, ao passo em que vão apresentando soluções e mais mistérios àquele universo. E ele não é o único. Os moradores da região acreditam fielmente que Maria Marruá (Juliana Paes) vira onça, principalmente, quando precisa defender os seus, ou “quando fica com réiva”. E não se espantariam se descobrissem que o “dom” teria sido passado à Juma.
Além dos conflitos entre os personagens, a música é outro grande destaque desta história. Foi há 30 anos e continuará sendo agora, no texto de Bruno Luperi e na direção de Rogério Gomes. A presença de Almir Sater, que esteve na versão escrita por Benedito, e retorna na nova versão, é um capítulo à parte. Almir vive o chalaneiro Eugênio, que leva e traz as pessoas ao Pantanal e, por isso, passa por quase todos os núcleos. Dentre os duetos especiais, o público terá a oportunidade de ouvi-lo tocar ao lado de Chico Teixeira (filho do parceiro de estrada de Almir, Renato Teixeira), que dará vida ao peão Quim na primeira fase da novela. Já durante as famosas rodas de viola que marcaram a segunda fase da versão original, Eugênio participará ao lado de Tibério (Guito) e Trindade, papel de Gabriel Sater, que encara o desafio de refazer o personagem original de seu pai.
Dos Estúdios Globo para o coração do Brasil
Uma visita à fazenda de Almir Sater foi essencial para a definição dos locais de gravação de ‘Pantanal’. O autor Bruno Luperi, o diretor artístico Rogério Gomes, o cenógrafo Alexandre Gomes e a gerente de produção Luciana Monteiro estiveram no Pantanal ainda em 2020, após o anúncio da nova versão da novela original de Benedito Ruy Barbosa, para buscar os locais mais bonitos – e viáveis – para esta produção.
Almir Sater, que deu vida ao peão Trindade na novela de Benedito, agora interpreta o chalaneiro Eugênio, no texto de Bruno. O cantor e ator comprou as terras que possui hoje no Pantanal há 30 anos, logo que as gravações, dirigidas por Jayme Monjardim, terminaram. “‘Pantanal’ foi um divisor de águas na minha vida. Comecei a trabalhar muito, como nunca antes, ganhei meu dinheirinho e logo comprei essa terra aqui onde estamos. Insisti 10 anos para que a antiga proprietária me vendesse, antes da novela. Quando fiz ‘Pantanal’ ela aceitou. Mas precisei comprar os fundos da fazenda primeiro para ela me vender essa parte na beira do rio. Aí fui virando fazendeiro também”, comenta.
Ao receber a equipe da nova versão em sua fazenda, Almir contou que depois de muita procura, Jayme havia escolhido aquele local. E que eles não encontrariam nada muito diferente do que ele encontrou na época. Portanto, ainda hoje, aquelas seriam as locações ideais para as gravações. “Eu soube que iriam regravar, achei bacana. De repente, estou em casa, eles chegam para nos visitar. Estavam escolhendo locações e aí vi que era sério. Eu falei: olha, o Jayme andou seis meses procurando um local até que ele chegou aqui. Você partir daqui já parte de um lugar que foi bom. Eles foram visitar outros lugares, mas sentiram que era aqui. Apresentamos fazendas próximas, pessoas que poderiam receber a equipe e tudo deu certo”, complementa Almir.
Para Alexandre Gomes de Souza, cenógrafo, as fazendas que conheceram na ocasião reuniam o pacote de cenários que precisavam para representar da melhor maneira as cenas da novela. “Quando viajamos ao Pantanal para a escolha das locações, não sabíamos exatamente o que esperar. Sabíamos, é claro, da exuberância e da riqueza da região e era o que buscávamos. Ao chegar, visitamos algumas fazendas e conhecemos toda aquela região da Nhecolândia. Ao nos depararmos com tudo aquilo, não havia dúvidas de que havíamos encontrado o local ideal, que não por coincidência foi o mesmo local onde as gravações aconteceram há mais de 30 anos. É um dos lugares mais bonitos do Pantanal e, com o empenho de toda a equipe, da produção e da direção, conseguimos viabilizar as gravações lá novamente. Foram seis fazendas que nos deram suporte direto, sendo três delas usadas como locação, contendo rio, casa, árvores, descampado, baías e tudo mais que era fundamental para as nossas cenas“.
O local escolhido fica a cerca de quatro horas da cidade mais próxima. Ao redor, somente fazendas e natureza selvagem. As fazendas dão apoio à produção, seja para hospedagem, para gravação ou almoxarifado. “Foram 12 caminhões para contemplar todo o material de produção, produção de arte, cenografia, figurino, caracterização e tecnologia – estimamos algo em torno de 144 toneladas de material. Tivemos que fazer o transbordo para caminhões 4X4 a fim de levar para dentro do Pantanal. Para cada caminhão baú, usávamos em média três ou quatro caminhões 4X4”, conta a gerente de produção Luciana Monteiro, explicando a logística da viagem.
Entre funcionários das fazendas, transporte, equipe e elenco, cerca de 150 pessoas estiveram envolvidas diretamente com as gravações no Pantanal no segundo semestre de 2021. Toda essa movimentação foi necessária para gravar “apenas” de 30 a 40% da obra. “Estive no Pantanal três vezes antes de começarmos a gravar. Muita coisa estava prevista. Sabíamos que seria difícil, por exemplo, a questão de combustível. Era preciso ter que comprar e estocar para atender gerador, barco; trazer os equipamentos e as pessoas; o transbordo de tudo que vem do Rio em caminhão baú… Mas ainda assim, sempre aparecia algum imprevisto”, comenta Luciana.
“A pressão que a gente tem é a do clássico que estamos colocando no ar. Uma obra enorme, uma novela que não é convencional. Uma logística muito diferente do que estamos habituados a fazer. Um lugar inóspito, com coisas que você não está acostumado a lidar nas grandes cidades. É um santuário. É impressionante. Isso te dá uma sensação de responsabilidade muito grande, de como você vai levar todas as pessoas pra lá e respeitar cada pedaço daquela terra, uma coisa incrível. A primeira produção foi genuína, uma coisa muito orgânica. O Pantanal é místico”, diz Andrea Kelly, gerente de produção de ‘Pantanal’.
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Os bastidores da viagem para o Pantanal
“O Pantanal mexe com as pessoas. É como se ele tivesse o poder de acolher quem ele quer e afastar quem não quer”, comenta Rogério Gomes, diretor artístico da novela, celebrando que a equipe e o elenco foram bem recebidos pelo bioma desde que chegaram, em meados de 2021. A riqueza da fauna e flora da região são realmente um espetáculo à parte e poderá ser visto pelo público logo na estreia da novela.
Bruna Linzmeyer interpreta a carioca Madeleine, que chega ao Pantanal contrariada após se casar com José Leôncio (Renato Góes). A atriz se sente um pouco como a personagem. “Olhei tudo com uma certa lente para Madeleine, não estive no Pantanal como Bruna, turista, passeando. Lembro que o primeiro dia que acordei, vi que onde estávamos, de manhã, tinha uma quantidade gigantesca de pássaros, de barulhos que eu nunca tinha ouvido. É uma mistura de ser encantador e desesperador. Todos os dias eu pensava que o lugar não tem esquina. Você não caminha e vira. É uma continuidade de verde, de amarelo queimado, e tantas outras cores…”, comenta a atriz sobre as primeiras impressões que teve. Ainda sobre a rotina de gravações no local, Bruna ressalta: “o dia a dia é muito diferente do que estou acostumada, mas tudo isso é muito legal para a personagem e para o trabalho. Poder “usar” esses bichos, ter uma mão afastando uma mutuca, matando o mosquito… Isso eu vou poder levar para o estúdio. A Mirica, produtora de arte, arrumou um leque de palha lindo para a Madeleine. Existirão cenas dela se molhando com mangueira, gelo, água. As pessoas no Pantanal não se mexem muito, talvez seja uma maneira de conter energia. Eles estão mais acostumados, a Madeleine, não. Então, podemos colocar isso em cena, trazer essa vivência para o trabalho”.
Renato Góes, que faz par romântico com Bruna, ao interpretar na primeira fase o fazendeiro José Leôncio, também tirou proveito da vivência local para a construção de seu personagem. “Um mês antes da gravação, passei 15 dias no Pantanal. Liguei para uns amigos e expliquei que eu gostaria de conhecer o local. Fui com eles, passamos duas semanas. Nesses dias, fui para a casa do Almir Sater passar três dias e depois estive nas redondezas de Aquidauana, no Bosque Belo, a meia hora da cidade. Foi um impacto muito grande. É uma quantidade imensa de animais. Eu queria perder esse encantamento, queria que meu personagem não tivesse um deslumbramento. José Leôncio está acostumado com biomas diferentes. E eu precisava quebrar isso. Portanto, esses 15 dias foram fundamentais”, revela o ator.
Fábio Neppo é Tião, que trabalha com Joventino (Irandhir Santos) e José Leôncio (Renato Góes); e é grande amigo de Quim (Chico Teixeira). O ator, que mora em São Paulo, passou mais de um mês na primeira vez em que esteve no Pantanal. “Foi difícil acostumar com o calor, sou de São Paulo, onde morei a vida inteira. E um desafio representar bem o peão, ainda mais se tratando dessa novela, desse tema, lembrando das pessoas que fizeram a primeira versão, é uma grande responsabilidade. Mas eu procuro sempre me divertir. Nas horas vagas, aproveitei para conhecer os pratos locais, como a sopa paraguaia, que descobri que não é uma sopa, mas sim um bolinho salgado, bem gostoso e bem tradicional”, comenta.
Já Chico Teixeira, que mora também em São Paulo, mas na área rural, se adaptou melhor ao calor, pois frequenta o Pantanal desde menino. “O Pantanal mudou minha vida. Fui para passar 15 dias, passei dois meses. O Almir (Sater) me pegou numa tarde, pediu para eu fazer uma base para ele estudar um solo de viola, e eu voltei tocando para São Paulo, destravei na música. E eu só sabia tocar um ou outro acorde antes. Eu e Gabriel (Sater) fomos criados como irmãos. São lindas as histórias que tenho de lá, é um encontro comigo mesmo, me energiza. Olhar o céu estrelado no meio do Pantanal, o banho de rio, tudo me marcou”, diz Chico, que é filho do músico Renato Teixeira.
“Pequenos grandes” detalhes no gigante Pantanal
A produção de uma novela pode ser comparada ao trabalho de uma orquestra. Se há um projeto amplo a ser admirado, são os detalhes que enriquecem o caminho e fazem do resultado algo tão especial. É neste contexto que se destacam os seis meses de pesquisa da produtora de arte Miriam Vianna – mais conhecida como Mirica –, mergulhando no universo pantaneiro até finalizar seu planejamento para a novela. Plano pronto, mais alguns meses para encomenda e confecção dos objetos de cena que trazem vida aos cenários e remetem à realidade vivida pelos fazendeiros, peões e moradores da região, levando para todo o Brasil características importantes da cultura de um dos biomas mais ricos do país.
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Seja em externa, no Mato Grosso do Sul, ou nos Estúdios Globo, no Rio de Janeiro, o departamento de arte é responsável por cada detalhe das cenas: a carne e as ferramentas de um churrasco; a sela da montaria; a rede da varanda; as bebidas da mesa de jantar; entre muitos outros itens. Uns mais comuns, outros mais peculiares. Para ‘Pantanal’, por exemplo, Mirica e sua equipe precisaram encomendar de uma artesã uma sucuri de quatro metros de comprimento. “Ela é maleável, temos que passar diariamente uma glicerina para não ressecar. Quando encomendamos, pedimos que houvesse a possibilidade dessa cobra entrar dentro da água”, conta a produtora.
O “dublê da sucuri” é carioca, mas muitos outros produtos Mirica fez questão de encomendar no Mato Grosso do Sul, de pequenos produtores locais, como é o caso de alguns itens que servem à fazenda de José Leôncio (Renato Góes/ Marcos Palmeira), à tapera de Juma (Alanis Guillen) e à chalana de Eugênio (Almir Sater). “Comprei a louça toda do povo Terena, produzida por indígenas da região. São travessas de cerâmica vermelha com desenhos indígenas para a fazenda, louças mais simples para a tapera e algumas sacolas que eles fazem de mercado, com desenhos lindos para a chalana, que encomendamos para homenagear esse povoado local. Quando entramos em contato com eles, tivemos ainda a oportunidade de conversar com o pajé e tirar algumas dúvidas sobre como são tratadas as pessoas que sofrem picadas de cobra ou são atacadas por animais, pois teremos em algumas cenas o que seria usado em casos como esses, já que o Velho do Rio em determinado momento irá ajudar uma pessoa, e explicará que aprendeu o ritual com indígenas”, diz Mirica, dando a dimensão da riqueza de detalhes do trabalho de seu departamento.
Como não poderia deixar de ser, a música tem um papel de destaque em ‘Pantanal’. Foi assim há 30 anos, na primeira versão, e será agora nesta nova versão. “O Papinha é um amante da música e queria um som legal, por isso a escolha dos violões foi tão importante. Ligamos para os artistas e perguntamos como estão acostumados a tocar. Fizemos um violão para o Tibério, Quim e Trindade. O Gabriel Sater nos mandou todas as especificações e encomendamos um igual ao dele, envelhecemos de forma que ficasse uma réplica. Até brinquei que ele não saberia dizer qual era qual. No caso do Almir, ele deixou a gente dar uma ‘envelhecidinha’ no violão dele. Portanto, é o único que usará seu violão próprio”, finaliza Mirica.
As cores do Pantanal representadas em cada personagem
Enquanto cenário e produção de arte enchem os olhos de quem gosta de reparar nos detalhes, o figurino não tem como se esconder, é o primeiro a ser visto e comentado. Na Globo desde 1995 – atuando como figurinista desde 2004 -, Marie Salles já assinou o figurino de grandes obras, como ‘Amor de Mãe’, ‘Avenida Brasil’, ‘Cordel Encantado’, ‘Novo Mundo’, entre outras novelas. Agora, na nova versão de ‘Pantanal’, a figurinista conta como ficou encantada com a explosão de cores que encontrou ao chegar por lá, em sua primeira viagem, e como procurou imprimir isso no trabalho.
“Foi uma das minhas primeiras impressões. Enxerguei essa natureza, seu ciclo, o nascer do sol, o caminho percorrido ao longo do dia e as tantas cores dessa natureza local, até o momento que a lua surge em seu lugar. É algo diferenciado. As árvores, flores, os ipês, fui pegando essas cores e colocando dentro dos personagens. No Joventino (Irandhir Santos), por exemplo, quis usar o pôr do sol, com tons alaranjados; a Juma (Alanis Guillen) também tem esse sol, mas em sua exibição momentos antes, tem um pouco do céu, dos rosas; já Filó (Letícia Salles/ Dira Paes) tem as cores das araras, dos ipês”, comenta Marie, animada com o resultado.
Seu trabalho, contudo, começou antes mesmo da primeira viagem, com uma ampla pesquisa, revisitando a primeira versão da novela e como os costumes e comportamentos mudaram de lá para cá. “A novela original era nossa diretriz. Assisti todos os capítulos para absorver aquelas escolhas da época. Na década de 1990, tínhamos bem marcado o conceito rural, mas hoje em dia vimos ao chegarmos ao Pantanal que ele está bem diferente. Entre assistir à novela e chegar ao Pantanal, comecei a construir minhas ideias com base em documentários, fotos, uma pesquisa profunda. E encontrei essa questão das cores ali também”, explica a figurinista. Embora não esteja no imaginário de todos os brasileiros, há hoje, no Pantanal, e em diversos outros locais do interior do Brasil, muito estampado, jeans. “Imagino que, assim como eu pensei, as pessoas pensem que o bege é uma cor que se destaca naquele cenário. Até era, antes. Não mais. Lá se usa cor, muita cor, azul, vermelho, verde, e fui inserindo isso principalmente na segunda fase”, complementa.
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Uma das personagens que mais atrai a curiosidade do público, a Juma, interpretada por Alanis Guillen, foi um desafio para Marie. “A Juma é uma pessoa que nunca viu nada. Ela não conhece nada, troca suas roupas na chalana, não tem dinheiro, não sabe o que é isso, o que é banco, televisão… Ela é bruta e tem uma energia bruta. Por isso, suas roupas são transparentes e são meio pôr do sol, meio rosa, meio nude. A sensação que vai dar é que ela está livre”, adianta Marie sobre a personagem.
Além das cores, outro destaque que o figurino merece é na indumentária específica dos peões pantaneiros. “Para o manejo com o gado, eles usam calça jeans, bota curta, faixa pantaneira, que não é só um acessório estético, mas tem a função de ajudar a manter saudável a coluna dos peões. Em geral, são feitas por mulheres pantaneiras e são bastante coloridas, é algo fácil de encontrar na região. Os peões usam ainda um cinturão de couro, onde colocam o canivete e o celular, que estará presente na segunda fase. Ele funciona como uma pochete, mas é um cinto. A calça de couro por cima da calça jeans é bastante usada também, a fim de proteger as pernas de quem anda a cavalo. Protege de galho e cobra, por exemplo. E tem o chapéu, usado por todos, porque é um local quase sempre muito quente”, explica.
As transformações da caracterização
Aliada direta do figurino, a caracterização se torna ainda mais fundamental quando é necessário marcar a passagem do tempo e quando se há personagens de aparência peculiar, como o Velho do Rio (Osmar Prado), que se transforma em sucuri; ou Maria Marruá (Juliana Paes), que se transforma em onça. E quem faz essa mágica acontecer em ‘Pantanal’ é Valéria Toth, caracterizadora na Globo há mais de 15 anos. Entre as tantas obras que assinou está, inclusive, ‘Paraíso’, que também teve o Pantanal como pano de fundo. “Isso foi há mais de 10 anos, então tinha um pouco dessa imagem pantaneira, de quem trabalha no dia a dia com o gado, grande parte do dia no sol”, comenta Valéria.
Seu primeiro passo foi entender cada personagem e o universo dele, e fazer uma pesquisa bem apurada sobre cada ator, estudando tudo o que ele já fez na TV e no cinema, a fim de não cair na mesmice. “Vai que de repente o ator acabou de fazer algo com uma barba e você coloca barba de novo; a atriz acabou de pintar o cabelo de determinada cor, você pinta de novo… Aqui, por exemplo, muitos peões usam barba, então tive esse cuidado de estudar tudo que cada um dos atores fez”, explica.
Em ‘Pantanal’, Valeria destaca que grande parte do seu trabalho envolveu o fato de ter atores diferentes na primeira e na segunda fase interpretando o mesmo personagem. “Esses personagens precisam ter indícios, sutilezas que os aproximam, para que o público possa identificar o ator anterior nessa mudança. Por exemplo, Malu Rodrigues e Camila Morgado, que interpretam Irma na primeira e segunda fase, respectivamente, ficaram ruivas, com cores bem parecidas. Tivemos o cuidado de pedir ao Renato (Góes) para deixar o cabelo crescer para se aproximar mais do visual do Marcos Palmeira, que passou um produto para abrir seus cachos. Os dois deixaram o cabelo crescer e ficaram com os cachos parecidos. Esses elementos mostram essa passagem de 30 anos”, explica.
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Por último, mas nem de longe menos importante, estão os envelhecimentos e marcas da vida tanto no Velho do Rio, interpretado por Osmar Prado, quanto na Maria Marruá, interpretada por Juliana Paes. “Osmar Prado tem a pele muito bonita. Papinha falou que o Velho do Rio não poderia ter uma pele assim, então foi necessário manchar um pouco. O mesmo fizemos com Juliana. Também colocamos nela um megahair cacheado longo na cor marrom. Deixamos a sobrancelha crescer, fizemos umas manchas na pele para descontruir a beleza da pele dela, para parecer uma mulher sem cuidados. Ela vive isolada na tapera, não tem vaidade. Usamos maquiagem de efeitos especiais nas mãos, para registrar as marcas de serviços físicos pesados. Desconstruir uma atriz belíssima como a Juliana também é desafiador”, finaliza.
Tecnologia como apoio fundamental à produção
A aposta na caracterização e no figurino é alta e complementar à área de tecnologia, que tem nesta novela entre seus principais objetivos trazer realismo à trama, já que a natureza é um dos pontos fortes desta história. E ainda reforçar a mística que envolve a relação dos personagens e animais, como é o caso do Velho do Rio; e de Maria e Juma Marruá. Eles se transformam ou não em bichos? O mistério continua, mesmo após 30 anos. A produção diferencia-se, ainda, pela aplicação de tecnologias inovadoras. Um exemplo é o primeiro episódio, que foi produzido em 8K e que terá transmissão em 8K pelo Globoplay, inaugurando a utilização desse formato em novelas. Além disso, o primeiro capítulo será transmitido – também pelo Globoplay – em Dolby Atmos, tecnologia de áudio que busca garantir maior nível de imersão ao espectador.
A iniciativa da transmissão nesta qualidade de imagem abre portas para que a tecnologia seja amplamente utilizada no futuro – à medida que os televisores com capacidade de leitura do 8K passem a ter penetração nos domicílios brasileiros. A resolução é uma evolução em relação ao 4K, representando uma qualidade de imagem quatro vezes superior. As siglas indicam a quantidade de pixels disponíveis na tela. Enquanto o 4K apresenta 3.840 x 2.160 pixels, o 8K reúne até 7.680 x 4.320. Como o primeiro capítulo de ‘Pantanal’ ficará disponível no streaming, a solução se torna atemporal, com potencial de impactar o público a longo prazo. Para o espectador, o grande diferencial do formato é permitir uma experiência muito similar à que ele teria vendo a olho nu, com precisão e realismo. O que se torna ainda mais impactante quando aplicado a uma novela com forte ambientação na natureza.
No caso dos animais, a onça, a sucuri e o boi foram estudados profundamente e, para tê-los em cena, foi utilizada a rotoscopia, técnica que tem como referência uma imagem captada em vídeo, redesenhada quadro a quadro, resultando, então, na composição. Além desses animais, foram reproduzidas por computação gráfica cerca de 10 espécies de aves. Uma curiosidade: para se ter uma ideia, para uma cena de oito segundos em que é utilizada a técnica de rotoscopia para inserir um animal em um ambiente interno, são necessárias, em média, 48 horas de trabalho em efeitos visuais.
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E, além da presença real de alguns animais no set de gravação no Pantanal, eles são reproduzidos ainda graficamente em modelos 3D. O processo é o mesmo de Hollywood: eles reproduzem um animal modelando-o tridimensionalmente e produzem todo o esqueleto para que ele possa ser animado; algo comum nas produções da Globo, mas não com animais do Pantanal. O trabalho da tecnologia, contudo, nem sempre é visto nas telas. Por vezes, a tecnologia atua nos bastidores, como por exemplo em relação à segurança do elenco. Foram usadas técnicas de aproximação e de implementação para transportar imagens de animais captadas no Pantanal e inseri-las em ambientes internos, por exemplo.
Em um capítulo em que a chuva é importante, os efeitos entram para criar os raios, as nuvens carregadas etc. No caso dos ninhais – no Pantanal são enormes – os efeitos visuais são utilizados para inserir os animais pousados nas árvores em planos mais abertos.
Música é protagonista em ‘Pantanal’
Basta olhar o elenco da nova versão de ‘Pantanal’ para entender que a música tem lugar de destaque. Almir e Gabriel Sater, Chico Teixeira, Guito, entre outras participações, estarão presentes nas rodas de viola que fazem parte da obra em momentos diversos da trama. E o público que teve a oportunidade de assistir à primeira versão há mais de 30 anos, e guarda em sua memória os acordes das músicas tocadas na época, pode aquietar o coração, pois “Pantanal”, música que marcou um país inteiro nos anos 1990, está garantida.
Composta por Marcus Viana, a música ‘Pantanal’ é um sucesso até hoje e pode-se dizer que foi responsável por boa parte da emoção gerada no público ao assistir às primeiras imagens da novela, durante as chamadas na programação da TV Globo. Para a trilha de abertura da nova versão de ‘Pantanal’, a música de Marcus foi regravada por Maria Bethânia e Almir Sater.
“É a canção de abertura de uma novela inesquecível e que terá uma releitura deslumbrante, de uma música muito inspirada, muito bonita, do fundo do coração do Brasil. É uma gravação que me comoveu, porque voltei a cantar com a viola do Almir Sater, isso é muito importante para mim, ele é um dos maiores músicos do Brasil, um grande compositor. É uma honra esse convite, fiquei bastante contente de fazer uma música poderosa, forte”, revela Bethânia.
Almir Sater está feliz em fazer parte dessa regravação, junto com Bethânia, na qual ele participa tocando uma viola caipira. “Faço um solo de viola, participando como músico. Uma honra enorme. Eu gostei muito de gravar “Pantanal” com Bethânia. Eu, Bethânia e ‘Pantanal’ temos uma relação antiga. Quando eu fiz a música “Tocando em frente” para entrar como um dos temas da novela, 30 anos atrás, ela me ligou perguntando se eu tinha alguma música nova. Falei sobre essa e ela pediu que eu cantasse por telefone. Cantei e na mesma hora ela disse que a música era dela. E assim foi. Ela gravou bonito, foi um dos temas de ‘Pantanal’ naquela época. Agora participarmos juntos dessa regravação fechando nosso ciclo ‘Pantanal’. Fiquei feliz, a gravação ficou muito bonita”, conta o músico.
Almir Sater tem ainda outras músicas da trilha sonora de ‘Pantanal’, como a inédita “Peabiru”, que será tema de José Lucas de Nada, personagem de Irandhir Santos na segunda fase da novela. ‘Chalana’, de Mário Zan e Arlindo Pinto, que ficou ainda mais conhecida na voz de Renato Teixeira, estará na novela em uma regravação de Roberta Miranda. E ‘Boiada’, que será tema de Joventino (Irandhir Santos) e José Leôncio (Renato Góes/Marcos Palmeira).
Filho de Almir, o músico e ator Gabriel Sater, também terá lugar na trilha da nova versão da trama, com a regravação de ‘Amor de Índio’, tema dos personagens Juma (Alanis Guillen) e Jove (Jesuíta Barbosa). A regravação ainda teve participação especial do maestro João Carlos Martins no piano.
“É a realização de um sonho, em momento algum eu pensei que isso seria possível, pois sabia da extrema concorrência de um mundo de pessoas interessadas em colocar a música nesta trilha sonora. Fazer parte do elenco e de um núcleo musical já é algo importantíssimo para mim, achei que só teria condições de tocar em cena. A melhor definição é que estou vivendo um sonho e estou imensamente agradecido pela confiança. E ainda mais gravando com minha referência e mestre, o maestro João Carlos Martins. É a primeira gravação oficial que fazemos juntos. Foi uma união de forças divinas que tornou isso possível nesse momento tão especial da minha vida. Vivendo o personagem Trindade e tendo uma música na trilha de uma novela tão importante como essa”, celebra Gabriel Sater.
Tendo o Pantanal como um dos protagonistas para esta saga familiar, é claro que o sertanejo estará presente diariamente na telinha, mas não será o único gênero musical da novela. Há também Iggy Pop, com ‘The Passenger’, para Jove; Alceu Valença, com a música ‘Dois Animais’, para Juma e José Lucas de Nada (Irandhir Santos); Belchior com ‘Comentário a respeito de John’ e “Vaqueiro de Profissão”, de Jair Rodrigues, para José Leôncio (Renato Góes/ Marcos Palmeira); além de músicas novas, de gêneros variados, e uma trilha instrumental totalmente original.
“Haverá muitas novidades na trilha, além das releituras. Temos um universo novo, um Pantanal novo, com imagens proporcionadas pelas novas tecnologias. É um panorama bem distinto daquela época da primeira versão. Tanto em relação à filmagem quanto à música também“, explica o produtor musical Rodolpho Rebuzzi. Sobre a trilha instrumental da novela, o produtor musical Rafael Luperi, irmão do autor Bruno Luperi, destaca: “as cenas que assistimos na sonorização estão espetaculares. São imagens deslumbrantes! É um trabalho muito grande, e o que eu sinto da equipe é que todos estão muito gratos por terem sido escolhidos para esse projeto. Fazer parte dessa história é uma responsabilidade gigantesca e um prazer enorme. Todo mundo vestindo a camisa, trabalhando e dando tudo o que pode para entregar uma novela que emocione as pessoas. Teremos surpresas bacanas”.
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‘Pantanal’ é escrita por Bruno Luperi, baseada na novela original escrita por Benedito Ruy Barbosa. A direção artística é de Rogério Gomes, direção de Walter Carvalho, Davi Alves, Beta Richard, Cristiano Marques e Noa Bressane. A produção é de Luciana Monteiro e Andrea Kelly, e a direção de gênero é de José Luiz Villamarim.